terça-feira, 9 de dezembro de 2008

O que me constrange

Esquina da Barão da Amazonas com a Ipiranga, perto da meia-noite, um menino magricelo e pequeninho, por volta dos 12 anos, pede dinheiro para comer. Debruça-se sobre a janela do carro, implora por moedas, por mais moedas, pois diz que está morrendo de fome. Como as nossas moedas eram poucas, ele começa a chorar. Eu entro em desespero e não sei o que fazer, fico com vontade de sair correndo, ele não desgruda do carro. O sinal já abriu e já fechou de novo. Eu passo o sinal vermelho. Eu fujo.
Eu fico constrangida. Não é, de forma alguma, o constrangimento a que se referem ZH e outros veículos de comunicação, mas além de profundamente triste, eu fico constrangida de viver em um mundo em que crianças estejam passando necessidades imensas e estejam humilhando-se nas sinaleiras, sendo ignoradas e destratadas várias vezes por dia. Eu me sinto mal de viver nessa cidade e de não enxergar o que eu posso fazer para melhorar a situação dessas pessoas.
O trabalho do Boca de Rua é importante e me orgulho dele, mas por vezes me parece tão pequeno diante da representação que a maioria dos habitantes constrói sobre os moradores de rua. Parece tão pequeno diante da brutalidade com que eles são tratados, do desrespeito, do olhar que carrega um preconceito tão grande.
Eu defendo que as pessoas possam viver nas ruas, se assim desejarem. Acredito que seja uma possibilidade, uma escolha para alguns, que não desejam se adequar às normas impostas pelo restante da sociedade. Entretanto, a minha visão sobre as crianças é distinta. O lugar delas não é na rua de madrugada, não pode ser uma opção se não lhes foram mostradas as demais possibilidades. E se eu já não sinto tanta pena dos adultos que estão nas ruas (eu tenho respeito por eles e fico indignada com o tratamento que recebem, o que é bem diferente), o único sentimento que eu guardo para as crianças é de dor.
O meu assunto é sempre o mesmo, mas não é por acaso que eu trabalho com essas pessoas há mais de 3 anos. Não é por acaso que é sobre elas o meu projeto de dissertação. É porque nada me dói mais do que saber (e ver, e ouvir) que são tratados como se não fossem seres humanos.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

No alarm and no surprises


O Radiohead confirmou turnê no Brasil em 2009.




Aaaaaaah, morro de tristeza se não conseguir comprar ingresso.

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

It`s the end of the world as we know it (and I feel fine)


This one goes out to the one I love


Eu acho totalmente desnecessário que o JN faça uma série de matérias sobre "os dilemas do próximo presidente estadunidense", mas não posso deixar de me emocionar e de ter esperanças de que realmente ocorram mudanças. Se eu não puder ter esperanças de que o mundo algum dia mude, ou de que existam de fato pessoas com vontade e capacidade de tornar a vida dos seres menos sofrida, não tenho mais o que fazer por esta vida. Eu não tenho nenhuma vergonha de ter chorado quando na quarta, ao acordar, descobri que nenhuma fraude tinha superado o Yes we can.
E o Zequinha Stadium é um bom lugar para shows. E o Stipe falou umas 4 vezes do Obama e, falem o que quiserem, ele anima horrores. Eu fico muito feliz de ter estado lá, na comemoração do REM pelo seu novo presidente, possivelmente no maior show do Brasil, em uma linda apresentação.
Durante três horas de hoje, eu esqueci das minhas tristezas e dos meus pontos. Because
Everybody hurts.
Take comfort in your friends.
Everybody hurts.
Don’t throw your hand.
Oh, no. Don’t throw your hand.I
f you feel like you’re alone, no, no, no, you are not alone

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Moradores de rua perguntam aos candidatos

Do blog do Boca de Rua:

Os integrantes do Boca de Rua elaboraram nove perguntas aos candidatos à prefeitura de Porto Alegre, José Fogaça (PMDB) e Maria do Rosário (PT). As perguntas foram encaminhadas às assessorias das candidaturas no dia 10 de outubro, às 16h30min. A assessoria da candidata Maria do Rosário enviou as respostas no dia 18, às 20h30min. Avisamos, então, a assessoria do candidato José Fogaça que, se não recebêssemos suas respostas, teríamos que publicar somente a entrevista de Maria do Rosário. Até o momento, não recebemos retorno da assessoria de Fogaça, portanto, seguem abaixo as respostas da candidata Maria do Rosário.
Moradores de Rua perguntam à Maria do Rosário:
O que você fará pelos moradores de rua de Porto Alegre, caso seja eleita prefeita?
Vamos trabalhar políticas de redução da pobreza integradas às ações de assistência social, educação, saúde e geração de renda. Também vamos abrir Centros de Apoio Psicossocial (CAPS) para atender quem quer se livrar das drogas, como o crack, e para os portadores de sofrimento psíquico, garantindo apoio também às suas famílias. As escolas públicas municipais serão abertas à noite com cursos profissionalizantes para dar chances de trabalho às pessoas que hoje têm dificuldades de arrumar emprego.
Qual você acha a melhor política de atendimento relativo à moradia: construir casas ou aumentar o número de albergues?
A possibilidade de uma moradia própria, sem dúvida, é a melhor opção no sentido de garantir ao cidadão a sua autonomia. Por isso, o nosso programa de governo tem propostas sólidas para a política habitacional e para a regularização fundiária, como a retomada do Programa Urbanizador Social, em que a prefeitura se articula com a iniciativa privada para a construção de loteamentos populares regulares a baixo custo. A albergagem é uma política necessária, mas não pode ser confundida com moradia, que é aquele lugar que cada um pode chamar de casa. Até mesmo a rua pode ser chamada de casa por quem nela mora, mas não um albergue, que é um local em que as pessoas vão por absoluta necessidade.
A violência contra moradores de rua, inclusive por parte da BM, Polícia Civil e Guarda Municipal aumentou nos últimos anos. O que você fará sobre isso, se for eleita?
Os moradores de rua são cidadãos e merecem respeito, não podem ser tratados com violência e truculência. O que deve ser combatido com firmeza é a criminalidade, por isso não se justifica a agressão contra os moradores de rua. Vamos investir em formação e qualificação profissional dos agentes de segurança sob responsabilidade do município para que a atuação seja cada vez mais responsável e adequada.
Não há na prefeitura políticas para organizar cooperativas de trabalho para moradores de rua. Você tem proposta para isso?
Certamente. Foi nos governos da Frente Popular que criamos o RAP (Programa de Reinserção na Atividade Produtiva), que todos os moradores de rua de Porto Alegre conhecem. Queremos retomar este programa, que foi abandonado pelo governo Fogaça, para que as pessoas que vivem nas ruas possam ter o orgulho de prover o sustento com o suor do próprio trabalho.
Sobre saúde: a população de rua precisa de melhor atendimento, especialmente à noite. Você tem proposta para isso?
Sim. Fogaça prometeu abrir mais postos de saúde à noite e não fez nenhum. Se nós vencermos a eleição, vamos levar adiante esta proposta e abrir mais postos de saúde à noite para toda a população. E, como não aceitamos qualquer tipo de discriminação com quem mora na rua, estes postos também estarão abertos aos moradores de rua.
Como vai ficar a questão dos guardadores de carro na sua gestão?
A questão dos guardadores é conseqüência do desemprego e deve ser tratada em várias frentes. Porto Alegre precisa se inserir na boa onda de crescimento econômico promovida pelas políticas de desenvolvimento do Governo Lula. Com a criação de um ambiente de inovação tecnológica, o fomento ao pólo de produção em saúde, a municipalização do Porto, a abertura da Agência de Desenvolvimento Metropolitano, conjugadas com as Escolas Técnicas e a Educação de Jovens e Adultos, nossa cidade terá empregos e oportunidades de qualificação não só para os guardadores, mas também para carroceiros e carrinheiros. Vamos cumprir a lei que já existe e registrar os guardadores de carros no sindicato da categoria, garantindo que a população usuária de automóvel passe a ver a atividade com mais respeito.
Como você vai resolver o problema da Casa de Convivência I, um importante espaço para os moradores de rua, que corre o risco de fechar?
Não só na Casa de Convivência I, mas em toda a rede assistencial da cidade, vamos retomar as boas práticas da Frente Popular, investindo os recursos necessários à manutenção digna das atividades.
Para fazer a revitalização do espaço do centro será necessário lidar com os moradores de rua que ficam ali. Você tem projeto para incluir essas pessoas em vez de removê-las?
Garantir dignidade às pessoas é um dos conceitos chave de nossa gestão. Por isso, entendemos que qualquer ação de impacto estrutural deve vir acompanhada de políticas públicas capazes de dar conta das demandas sociais. No caso da revitalização do Centro, é preciso buscar soluções de inclusão efetiva dos moradores de rua, pois a remoção das pessoas dali, além de agredir a dignidade humana, é uma medida meramente paliativa. Nosso programa de governo prevê a oportunização de cursos profissionalizantes e geração de renda, além da criação de cooperativas de trabalhadores, como alternativas para incentivar a inclusão de grupos como os moradores de rua. Os próprios moradores serão incluídos nas estratégias de revitalização do Centro, podendo trabalhar com a limpeza das vias, a jardinagem dos canteiros e praças e até mesmo como guias turísticos.
Foi realizado um censo sobre a população de rua, no início do ano, com a promessa de constituir políticas públicas para essa população. Até agora não vimos nada ser feito. Se vocês for eleita, o que fará?
A pesquisa realizada pela UFRGS indica que aumentou o número de crianças de zero a seis anos nas ruas, de 8% para 20%. E, infelizmente, o número de crianças maiores de seis anos só não cresceu porque muitas delas morreram vítimas do crack. Por isso, a atitude de nossa gestão em relação às crianças será imediata, no sentido de localizar a família e iniciar o acompanhamento para que seja retomado o vínculo, se não com o pai ou a mãe, com uma avó, tia, tio ou familiar que se responsabilize. Caso a pessoa em situação de rua seja adulta, além do auxílio psicológico, quando necessário, será providenciado o encaminhamento para programas de qualificação profissional e moradia, pois a melhor forma de dar condições à população de rua é oportunizando casa e emprego. A questão do HIV/AIDS também nos preocupa muito, pois não há políticas adequadas hoje para tratar das pessoas soropositivas.

segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Ela era pessoa pública, então podemos bisbilhotar

Hoje, esperando no xerox da Fabico, acompanho o enterro da menina Eloá pela Record News. O jornalista comenta que cerca de 5000 pessoas estão presentes, já que a adolescente era pessoa pública e muito querida.
Ela não era pessoa pública e é absurdo utilizar um argumento tão canalha para explicar o sensacionalismo impressionante que domina a cobertura do caso. Repórteres constrangendo os amigos do rapaz para tentar cavar alguma informação no estilo "ele era muito ciumento, transtornado e queria bater em quem olhasse para ela". Jornalistas desrespeitando pessoas, ignorando a dor delas para vender matérias.
Essas informações não são relevantes. São utilizadas pelos meios de comunicação para chamar a atenção de pessoas que só podem ser ingênuas, caindo nos truques televisivos. Ana Maria Braga tecendo comentários sobre a sanidade mental do sequestrador, com auxílio de psicólogo/psiquiatra (ela não soube dizer a profissão do seu convidado): "Doutor, como podemos identificar se o namorado da nossa filha não é um sequestrador em potencial?", pergunta a loira-esperta.
O jornalismo brasileiro é uma vergonha e, ao que parece, fica muito feliz com a ocorrência de casos como esses, que podem render no mínimo uma semana de matérias insensíveis e que invadem a vida de todos os envolvidos sem qualquer consideração. E sem nenhuma avaliação da pertinência e da necessidade de revelar certos fatos.

terça-feira, 7 de outubro de 2008

Yes, we can

Bonitos, o discurso e o vídeo. Ainda mais vindo do Will.i.am, do Black Eyed Peas.


"Yes we can to justice and equality. Yes we can to opportunity and
prosperity. Yes we can heal this nation. Yes we can repair this
world. Yes we can."




sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Os candidatos e os moradores de rua

1) Matéria publicada na ZH de domingo sobre o posicionamento dos candidatos à prefeito em relação aos moradores de rua. Sempre a mesma jornalista, que insiste em utilizar as palavras "constrangimento" e "extorsão" para se referir a essa parte da população.
Incrível a declaração do candidato Carlos Gomes, que acredita que tais pessoas deveriam ser retiradas à força das ruas, já que não é correto que "40 ou 50" seres fiquem constrangendo os cidadãos. Além de demonstrar uma postura autoritária, prova que é um ignorante, já que não sabe que na cidade que pretende governar existem mais de mil pessoas em situação de rua.
E mais: Maria do Rosário reforça a representação social dominante sobre os sem-teto ao dividí-los em dois grupos, os que apresentam algum distúrbio psicológico e os que andam armados e são ameaça. São, portanto, problema de internação psiquiátrica ou de prisão pela Brigada Militar. E só. Não apresenta nenhuma proposta sobre melhoria dos abrigos, sobre continuação do Programa de Reinserção à Atividade Produtiva (RAP), sobre mais respeito das polícias com esses sujeitos. Seu comentário desconsidera a diversidade de motivos que leva os indivíduos para as ruas e os faz ali permanecer e os reduz a duas categorias estereotipadas.
2) Entrevista com Maria do Rosário publicada hoje em ZH. Questionada sobre "o pior de Porto Alegre", responde: as pessoas que vivem na rua.
Não poderia ter me deixado mais triste.